Brunna Cortez tornou-se cadeirante por conta de uma violência e hoje luta por mais dignidade
No Dia Internacional da Pessoa Com Deficiência, o Portal Rio 360º Notícias conversa com uma mulher trans que só quer viver e exercer os seus direitos como cidadã e com igualdade. Brunna Cortez se tornou cadeirante por ter sido vítima de uma violência e, hoje, luta para expor a sua arte, como dançarina, pelas ruas da sua cidade.
Moradora de Bom Despacho, Minas Gerais, ela nos conta um pouco sobre a sua rotina, os seus desafios, sonhos e dificuldades. Aos 26 anos, ela é aposentada por invalidez, mas estuda designer de moda e sonha sobreviver deste ofício e da sua arte de dançar.
Rio 360º – Conte um pouco para gente como você se tornou cadeirante.
Brunna – Eu não lembro exatamente como aconteceu, pois eu bati a cabeça e fiquei desacordada por dois dias, mas o segurança do supermercado, uma das testemunhas, me contou que 4 homens me bateram até eu desmaiar e me jogaram dentro de um córrego que não tinha água. Por conta desta queda, eu quebrei duas vértebras e fiquei paraplégica. Foi um crime de homofobia.
Rio 360º – Como foi o processo de aceitação desta nova condição?
Brunna – O processo de aceitação, por incrível que pareça, não foi muito difícil. Eu não foquei tanto na minha nova condição de cadeirante. O que pesava para mim era a dança. Eu me perguntava se conseguiria voltar a dançar, como eu faria para conseguir dançar… Então, a fase de aceitação foi fácil, falando por mim. O meu grande pavor era não conseguir mais dançar, já que antes da violência eu dançava e fazia apresentações.
Rio 360º – Hoje (03/12) é o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência. Você se sente “respeitada” socialmente mediante suas condições? Quais são as suas maiores dificuldades no dia a dia?
Brunna – Relacionado a minha cidade, não acho que sou respeitada, principalmente na questão da acessibilidade. Além de Bom Despacho, em nenhuma cidade que eu vá, aqui em Minas Gerais, eu me sinto respeitada. Não falo apenas da acessibilidade de locomação ou dos lugares, falo também do despreparo das pessoas que precisam lidar com outras pessoas com deficiências, entendeu? Eu vejo que há um despreparo muito grande nisso.
Rio 360º – Você se sente excluída?
Brunna – Depende. Eu me sinto excluída, às vezes, em determinadas situações. Quando alguns amigos vão fazer algo e não me levam, porque sou cadeirante e vai ser difícil, é uma delas, entendeu? Esse é um dos quesitos que eu me sinto muito excluída. A falta de acessibilidade e as dificuldades de locomoção em alguns lugares que não são adaptados fazem muito isso.
Rio 360º – Usando a sua experiência de cadeirante, se você pudesse fazer algo, o que faria para tornar a vida das pessoas com deficiência mais digna?
Brunna – Sem dúvida, eu obrigaria todos os locais a terem acessibilidade. Principalmente os banheiros… Ao meu ver, parece que é uma das coisas mais complicadas de se ter. Aqui na minha cidade, quando vou a algum barzinho… Eu gosto muito de sair, sabe? Às vezes as pessoas esquecem que as pessoas com deficiência ainda vivem, gostam de sair, frequentar bar… Quando estou na noite, eu tenho que sair do bar para ir ao banheiro, atravessar a rua, tenho que ir a um lugar escuro porque no banheiro não entra a minha cadeira… Como pessoa com deficiência, se eu pudesse mudar algo, com certeza, investiria em acessibilidade em todos os lugares.
Rio 360º – Na sua cidade, no seu Estado, você percebe iniciativas ou tem conhecimento de políticas públicas que contemplem as pessoas com deficiência? Como cidadã, qual é o seu sentimento?
Brunna – Se tem eu não estou sabendo, principalmente na minha cidade. Porque aqui é um descaso só! No quesito acessibilidade, a nota é zero. Não sei se estão tomando providências, se há iniciativas, mas… A única coisa que posso falar que funciona é o transporte público. Aqui na minha cidade funciona.
Rio 360º – Você é dançarina, faz apresentações artísticas… Como foi o processo de adaptação da sua arte na cadeira de rodas?
Brunna – Por bastante tempo eu fiquei sem dançar, pois não sabia como seria, não sabia como adaptar à cadeira de rodas. Eu pensava que fosse ficar no palco igual uma boba da corte, dançando para um lado e para outro, mexendo o braço… Mas, na verdade, o que me faltava era sentimento. Quando se coloca sentimento nas coisas, tudo muda. Foi assim que consegui chegar ao meu nível de adaptação, de criação de coreografias… Hoje é bem mais fácil, eu faço num piscar de olhos.
Rio 360º – Hoje em dia, de que forma e onde você expõe a sua arte?
Brunna – Hoje em dia, sou dançarina e coreógrafa. A dança sempre esteve presente na minha vida, antes de ser cadeirante eu já dançava. Eu era professora de dança, inclusive. Agora na cadeira de rodas, eu sigo me apresentando em locais, eventos LGBTQIAPN+, fora da minha cidade etc.
Rio 360 – Qual mensagem você deixaria para as pessoas com deficiências neste dia celebrativo?
Brunna – Eu falaria para as pessoas com deficiência nunca desistirem, para sempre acreditarem em si mesmas. Por mais que, às vezes, as pessoas não acreditem, se a gente acreditar em tudo fica diferente. A gente não deve desistir dos nossos sonhos, precisamos ser perseverantes. Nunca será fácil, mas a gente tem o poder de transformar as coisas, deixando elas menos difícil. Basta a gente querer.
Rio 360º – Você sente orgulho da Brunna, agora? O que você “diria para a Brunna” hoje, mediante a tudo que passou?
Sinto orgulho demais! Eu me parabenizo sempre por não ter desistido de mim, por ter suportado tudo até hoje. “A gente precisa arrumar um jeito de dançar no meio desse caos todo”. E eu consegui!